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Bob Marley

15 mar 2014

Robert Nesta Marley Booker, mais conhecido como Bob Marley1 (Nine Mile, 6 de fevereiro de 1945 — Miami, 11 de maio de 1981), foi um cantor, guitarrista e compositor jamaicano, o mais conhecido músico de reggae de todos os tempos, famoso por popularizar o género. Marley já vendeu mais de 75 milhões de discos.2 A maior parte do seu trabalho lidava com os problemas dos pobres e oprimidos. Levou, através de sua música, o movimento rastafari e suas ideias de paz, irmandade, igualdade social, libertação, resistência, liberdade e amor universal ao mundo. A música de Marley foi fortemente influenciada pelas questões sociais e políticas de sua terra natal, fazendo com que considerassem-no a voz do povo negro, pobre e oprimido da Jamaica. A África e seus problemas como a miséria, guerras e domínio europeu também foram centro de assunto das suas músicas, por se tratar da terra sagrada do movimento rastafari.
Hoje pode ser considerado o primeiro e maior astro musical do Terceiro Mundo e a maior voz deste. Suas músicas mais conhecidas são ” I Shot the Sheriff “,” No Woman, No Cry”,” Could You Be Loved “,” Stir It Up “,” Get Up, Stand Up “,” Jamming “,” Redemption Song “,” One Love/People Get Ready “e,” Three Little Birds “, e tambem lançamentos póstumos como ” Buffalo Soldier “e” Iron Lion Zion “. A coletânea Legend, lançada três anos após sua morte e que reúne algumas músicas de álbuns do artista, é o álbum de reggae mais vendido da história. Bob foi casado com Rita Marley (de 1966 até a morte), uma das I Threes, que passaram a cantar com os Wailers depois que eles alcançaram sucesso internacional. Ela foi mãe de quatro de seus doze filhos (dois deles adotados), os renomados Ziggy e Stephen Marley (lê-se Stivân), que continuam o legado musical de seu pai na banda Melody Makers. Outros de seus filhos, Ky-Mani Marley, Julian Marley e Damian Marley (vulgo Jr. Gong) também seguiram carreira musical. Foi eleito pela revista Rolling Stone o 11º maior artista da música de todos os tempos.

Juventude
Bob Marley nasceu em 6 de fevereiro de 1945 em Saint Ann, no interior da Jamaica, filho de Norval Sinclair Marley, um militar branco, capitão do exército inglês e Cedella Booker, uma adolescente negra vinda do norte do país. Cedella e Norval estavam de casamento marcado para 9 de julho de 1944. No dia seguinte ao seu casamento, Norval abandonou-a, porém continuou dando apoio financeiro para sua mulher e filho. Raramente os via, pois estava constantemente viajando. Após a morte de Norval em 1955, Cedella Booker casou-se com Toddy Livingstone, também de Saint Ann, e mudou-se com Marley para Trenchtown, a maior e mais miserável favela de Kingston, onde era provocado e rejeitado pelos negros locais por ser mulato e ter baixa estatura. Bob teve uma juventude muito difícil, e isso o ajudou a ter personalidade e um ponto de vista bastante crítico sobre os problemas sociais.

A Jornada
Quando foi morar em Trenchtown, Bob ainda novinho já tinha uma ligação forte com a música. Ele e o seu amigo Bunny, filho do homem com quem a mãe de Bob havia casado, improvisavam guitarras feitas de lata e acompanhavam os sucessos vindos da América, particularmente de New Orleans, sintonizados em um mini-rádio transistorizado. Eles captavam Ray Charles, Fats Domino, Brook Benton (um dos preferidos de Marley) e grupos como os Drifters, que eram muito populares na Jamaica.
Nesta época, a juventude jamaicana fervia com esta gama variada de R&B americanos, mas ter um rádio transístor para captar a nova onda era luxo, por isto nomes como Coxsone Dodd, Leslie Kong e outros, ficaram famosos por seus Sound Systems (sistemas de som), normalmente um furgão equipado com aparelhagem suficiente para fazer a rapaziada se animar com os últimos sucessos chegados dos EUA nas ruas dos guetos.
Por volta do início dos anos 60, o movimento R&B começou a decair nos Estados Unidos e tornou-se difícil a aquisição de discos para satisfazer a dieta insaciável de lançamentos que o povo jamaicano exigia. Os donos dos Sound Systems viram-se então obrigados a investir no talento dos músicos locais. Começava-se a desenvolver nesta época na ilha, uma música que incorporava as tradições musicais jamaicanas com influências do R&B e das Big Bands, resultando no vibrante e agitado som do Ska. A independência da Jamaica em 1962, deixando de ser uma colónia britânica, ajudou a compor o momento de criação de uma música originalmente jamaicana.
Os donos de Sound Systems tornaram-se então produtores. Alugavam algum estúdio de duas pistas, descobriam algum rapaz que tivesse o talento de cantar suas emoções vividas nos guetos de Kingston, e faziam discos de Ska.

Apartamento de Bob Marley em Londres, onde ele viveu em 1972.
Quando Bob Marley deixou a escola aos 14 anos, parecia ter apenas uma ambição: a música. Mas, muito para agradar sua mãe, que temia que ele se tornasse um rude boy (como são conhecidos os delinquentes juvenis na Jamaica), arranjou um emprego de soldador.
Passava suas horas livres ao lado de Bunny aperfeiçoando as suas habilidades vocais. Eles eram ajudados por um dos mais célebres habitantes de Trenchtown na época, o cantor Joe Higgs, que dava aulas informais de canto para artistas aspirantes que estivessem interessados em aperfeiçoar suas habilidades. Foi numa destas sessões que Bob e Bunny Wailer conheceram Peter Tosh, outro jovem com grande ambição na música.
Em 1962 Bob fez uma audiência para o produtor Leslie Kong, que veio a publicar as suas primeiras gravações. “Judge Not”, composta por Bob Marley, foi a primeira. Apesar de as músicas gravadas não terem sido executadas nas rádios e chamado pouca atenção do público, só vieram confirmar a ambição de Marley de se tornar cantor.
No ano seguinte, Bob decidiu que o caminho a seguir seria criar uma banda. Juntou-se com os seus amigos Bunny Wailer e Peter Tosh para formar os “Wailing Wailers”. Escolheram este nome para a banda porque diziam que, ao nascer no gueto, nasciam a lamentar, e “wail” signifca “lamentar”. O novo grupo tinha um mentor: o percussionista rastafari chamado Alvin Patterson, que apresentou os garotos para o produtor Coxsone Dodd. No verão de 1963, Coxsone ouviu os Wailing Wailers e, satisfeito com o som do grupo, resolveu gravá-los.
Os Wailing Wailers finalizaram seu primeiro single, “Simmer Down” através do selo de Coxsone, durante as últimas semanas de 1963. Já em janeiro do ano seguinte era a primeira nas paradas jamaicanas, e se manteve nesta posição durante os próximos dois meses.
O grupo, Bob, Bunny e Peter juntamente com outro cantor, Junior Braithwaite e mais duas backing vocals, Berverly Kelso e Cherry Smith, eram a grande novidade no cenário jamaicano. “Simmer Down” causou grande sensação na ilha e os Wailing Wailers começaram a gravar com regularidade para o lendário Studio One de Coxsone Dodd. O grupo agora criava novos temas identificando-se com os Rude Boys das ruas de Kingston. A música jamaicana finalmente tinha uma identidade e alguém que falava a mais pura linguagem do gueto.
Nos anos seguintes, a banda de Marley colocou mais alguns hits nas paradas da ilha, o que estabeleceu a popularidade do grupo mas, apesar disto as dificuldades económicas que atravessavam fez com que Junior Braithwaite, Berverly Kelso e Cherry Smith deixassem a banda. Além disso, a mãe de Bob havia-se casado novamente e mudou-se para Delaware, nos Estados Unidos, onde economizou algum dinheiro para mandar uma passagem de avião para o jovem Marley, naquela altura com 20 anos. A intenção da mãe de Bob era que lá ele começasse uma nova vida. Antes de se mudar para a América do Norte, ele conheceu uma jovem chamada Rita Anderson, e no dia 10 de fevereiro de 1966 casaram-se.
A estadia de Marley nos Estados Unidos teve vida curta. Ele só trabalhou lá o suficiente para financiar a sua verdadeira ambição musical. Em outubro de 1966, Bob Marley, depois de oito meses na América do Norte, retornou à Jamaica. Este foi um período decisivo na sua formação, pois o imperador da Etiópia, Haile Selassie, havia feito uma visita de estado na Jamaica em abril daquele ano, e durante o período em que Bob esteve fora, o movimento rastafari ganhou nova vida nas ruas de Kingston. Marley começou cada vez mais a se aprofundar dentro do espírito e cultura rastafari.
Em 1967, a música de Bob já refletia a sua nova crença. Ao invés de cantar hinos para os Rude Boys, Marley começou a compor temas sociais e espirituais, o que se tornou sua marca registrada e seu maior legado. Uniu-se novamente a Peter Tosh e Bunny Wailer para reorganizar o grupo. Eles simplificaram o nome original “Wailling Wailers” para “The Wailers”. Rita tinha iniciado sua carreira como cantora e alcançou um grande sucesso com a música “Pied Piper”, uma versão cover de uma música pop inglesa. A música jamaicana, por sua vez, estava a transformar-se: o agitado Ska tinha sido substituído por um ritmo mais lento e sensual chamado Rocksteady.
O compromisso que os Wailers vinham assumindo com o movimento rastafari provocou um certo conflito com o produtor Coxsone Dodd. Então, decidiram controlar o seu destino fundando seu próprio selo, Waili’N’Soul. Devido à ingenuidade deles nos negócios, apesar de terem conseguido algum sucesso no princípio, a firma acabou falindo no final de 1967. Apesar disto, o grupo sobreviveu inicialmente como compositores para uma companhia associada ao cantor americano Johnny Nash, que na década seguinte teve um grande sucesso internacional com a música “Stir it Up” de Marley.
No final da década de 1960 e início de 1970, os Wailers também se uniram ao produtor Lee Perry, o mago dos estúdios, que transformou as possibilidades técnicas de gravação numa forma requintada de arte. A união dos Wailers com Lee Perry resultou em algumas das mais belas produções da banda. Faixas como “Soul Rebel”, “Duppy Conqueror”, “400 Years” e “Small Axe” não foram apenas clássicos, mas definiram a direção do Reggae. Nesta mesma época, o baixista Aston “Family Man” Barret e seu irmão, o baterista Carlton se uniram aos Wailers. Eram eles que formavam a base rítmica dos “Upsetters”, o grupo de estúdio de Lee Perry com quem os Wailers tinham gravado em todas aquelas sessões junto ao produtor. Os dois irmãos eram, indiscutivelmente, a melhor sessão rítmica da época e o The Wailers, junto a eles, começou a ganhar forma. Anos mais tarde, Family Man, numa declaração, disse:

Nós éramos a melhor cozinha e os Wailers o melhor grupo vocal da Jamaica, então nos perguntamos: por que não pôr o mundo de joelhos?”

A reputação do grupo era aclamada por tudo quanto era Caraíbas, mas continuavam desconhecidos internacionalmente.
No verão de 1971, Bob aceitou o convite de Johnny Nash para acompanhá-lo até a Suécia, onde o cantor americano tinha sido encarregue de produzir a trilha sonora para um filme sueco. Enquanto estava na Europa, Marley assinou um contrato com a CBS, que naturalmente também era a gravadora de Nash. No verão de 72 todos integrantes dos Wailers estavam em Londres promovendo ostensivamente um single para a CBS: “Reggae on Broadway”. Mas assim como o filme de Nash, o projeto fracassou e os Wailers se viram em maus lençóis numa terra distante. Como última cartada na Europa naquele ano, Marley dirigiu-se aos estúdios da Island Records, em Londres, e perguntou se podia ver seu fundador Chris Blackwell.

Bob Marley em concerto em 1980.
Chris Blackwell, um jamaicano branco, descendente de ingleses, pertencente a uma rica e tradicional família da ilha, havia fundado a Island Records na Jamaica ainda no final dos anos 50 e já estava envolvido com a cultura musical jamaicana, mesmo antes da época do Ska. A companhia foi uma das pioneiras em exportar a música jamaicana para o mundo e na década de 60 se tornou a principal responsável por lançamentos e divulgação da música da ilha no Reino Unido, desde o Ska, passando pelo Rocksteady até o Reggae. A Island, ainda nos anos 60, também expandiu seus negócios para o rock’n roll, tendo em seu “casting” artistas como Traffic, Jethro Tull, King Crimson, Cat Stevens, Free e Fairport Convention. Assim, quando Marley fez seus primeiros passos dentro da Island em 1971, ele estava se conectando com a mais quente das gravadoras independentes na época.
Blackwell sabia da reputação de Marley na ilha caribiana. Tanto o lado no qual eram conhecidos como um bando de Rude Boys, quanto a de que eram de qualidade e fibra inigualáveis e que, acima de tudo eram muito populares e respeitados tanto na Jamaica como, já na época, em todo Caribe. Foi oferecida ao grupo uma oferta de confiança aonde Chris Blackwell, o contratante, dava um adiantamento de £ 4.000 (o equivalente aproximadamente a US $ 8.000), e uma carta branca para eles irem para a Jamaica e produzirem o material para o primeiro álbum do The Wailers na Island Records. Pela primeira vez uma banda de Reggae tinha este tipo de tratamento, comparável aos seus contemporâneos do rock n’ roll, com acesso ao mais alto nível de gravação. Antes disso, considerava-se que Reggae só vendia discos “singles” ou coletâneas de baixo custo. Blackwell foi advertido por várias pessoas a não confiar tanto assim nos garotos e que possivelmente eles sumiriam com o dinheiro sem que se visse resultado de gravação alguma. Depois de alguns meses, os Wailers estavam de volta a Londres com o material que haviam gravado nos estúdios da Island em Kingston.
Para tornar o material mais agradável aos ouvidos do público internacional, foram acrescentadas às gravações originais, solos de guitarra e linha de teclados executadas por músicos ingleses. A estratégia de Blackwell consistia em lançar os Wailers como uma nova banda de Rock, composta por negros jamaicanos. O resultado disso foi o álbum “Catch a Fire”, com uma sugestiva embalagem em forma de isqueiro, de onde se retira o vinil abrindo a tampa. O disco foi pesadamente promovido, iniciando a partir daí a escalada internacional do sucesso e reconhecimento de Bob Marley.
A cadência de Marley, aliada a suas letras de paz, protesto e engajamento social contrastavam completamente com o que rolava no cenário do rock da época. A gravadora decidiu que os Wailers deveriam excursionar fazendo shows tanto no Reino Unido, como também nos Estados Unidos, de novo uma completa novidade para uma banda de Reggae. A banda embarcou numa excursão pela Europa, o que a solidificou em suas performances ao vivo. Depois de três meses, voltaram à Jamaica, e Bunny, decepcionado com a vida na estrada e o pouco dinheiro que ganhavam, recusou-se a participar da tour pelos Estados Unidos. Foi substituído por Joe Higgs, o mestre musical dos ainda adolescentes Wailers, nos tempos de Trenchtown. Nos Estados Unidos, Bob Marley e seus parceiros lotaram alguns clubes noturnos e abriram shows para outros artistas. A repercussão da banda em sua tournée andava tão bem que foram arranjadas 17 datas para os Wailers abrirem os shows de Sly & The Family Stone, na época a maior banda de Black Music da América. Depois de abrir quatro shows para Sly, Bob Marley e sua banda foram retirados da tournée. Pelo que parece, Bob Marley & The Wailers destacavam-se mais do que a banda que deveria ser a atração principal.

Sede da Tuff Gong Records, gravadora fundada por Bob.
O primeiro sinal da projeção de Bob Marley como astro internacional viria através de um presente de Chris Blackwell, para o proeminente novo artista. Logo após o impacto do álbum “Catch a Fire” no mercado europeu, Blackwell entregou a Marley as chaves da Island House, uma imponente mansão situada na Hope Road Avenue, parte rica de Kingston, inclusive muito próxima à sede do governo, que ficava rua abaixo com seus imensos jardins. Em pouco tempo o novo “yard” de Marley tornou-se um núcleo de criação e uma espécie de comunidade, com acesso livre para toda a família, amigos do gueto, rastas, namoradas de uns e outros, músicos, jornalistas estrangeiros, e mais alguns outros que eventualmente apareciam para jogar o famoso futebol de fim de tarde no estacionamento da casa. Bob Marley, como revelam relatos de amigos e família, dava dinheiro e comida para pessoas que vinham da favela pedir. Era comum formar filas de mulheres com bebés, crianças, jovens e até mesmo homens que queriam começar um pequeno negócio, na porta da casa do músico.
Este clima de euforia de uma nova vida comunitária religiosa e criativa encontraria sua tradução no disco “Burnin”, segundo lançamento dos Wailers pela Island Records, no final de 1973. As músicas, com um conteúdo ainda mais politizado e social que as do álbum anterior, atingiam o público branco da Europa e Estados Unidos com clássicos como “Get Up, Stand Up”, na qual Bob alerta as pessoas para que lutem por seus direitos , “I Shot the Sheriff”, etc. Estava a acontecer uma verdadeira revolução musical e ideológica.
Celebridades como Paul McCartney, Mick Jagger começavam a admirar o ascendente trabalho do jamaicano. O lendário Eric Clapton ressurgiu regravando “I Shot the Sherif”, de Marley, versão que atingiu os primeiros lugares nas paradas, colocou o guitarrista inglês novamente no cenário musical e ajudou a alavancar ainda mais a carreira de Bob Marley & The Wailers.
Em outubro de 1974, “Natty Dread” foi lançado. Graças ao sucesso da faixa “No Woman No Cry”, que atingiu o primeiro lugar na parada inglesa, Marley tornou-se ainda mais popular. A essa altura, o grupo já não contava mais com Bunny Wailer e Peter Tosh, que partiram para suas carreiras solo e foram substituídos pelas I-Threes: as cantoras Judy Mowatt, Marcia Griffiths e a mulher de Bob, Rita Marley.
Com o lançamento do próximo disco, “Rastaman Vibration”, em 1976, o cantor conquistou a fama nos Estados Unidos. Na Jamaica, a sua fama já era quase mística, e em grande parte graças às mensagens de suas músicas, o pensamento rastafari estava a tornar-se muito popular nos guetos jamaicanos. Em meio a este quadro, também havia o fato de o imperador etíope Haile Selassie, considerado pelos rastas como a representação de Deus na Terra, ter falecido no final de 1975.

Tiroteio e a violência eleitoral
Bob Marley & The Wailers ao Vivo no Crystal Palace Park durante a Uprising Tour.
Em 1976, ano de eleições parlamentares na Jamaica, a ilha vivia um dos períodos mais sangrentos da sua história. Havia, praticamente, uma guerra civil entre jovens militantes que defendiam partidos distintos. Bob Marley quis dar um show gratuito pela paz e pela união da juventude. O então primeiro-ministro, líder do partido PNP, Michael Manley, apoiou e deu força à ideia do concerto pela paz, para supostamente apaziguar as tensões antes das eleições, marcadas para dali uns dias. Dois dias antes do show, porém, a casa de Bob Marley na Hope Road Avenue foi invadida por um grupo de pistoleiros defensores do candidato opositor a Michael Manley, que invadiu a sala onde Marley estava a ensaiar, e disparou tiros em todas as direções, com o intuito de o matar. Miraculosamente, ninguém foi morto no ataque noturno. Don Taylor, empresário de Marley, estava a aproximar-se dele no exato momento em que os homens começaram a disparar, levando vários tiros e tendo, como legado deste fato, uma vida sobre a cadeira de rodas. Rita Marley levou um tiro de raspão na cabeça. O projétil ficou alojado em seu couro cabeludo. Marley recebeu um tiro que raspou seu peito logo abaixo do coração e penetrou profundamente em seu braço esquerdo. O caso de Marley foi o menos grave entre os atingidos, sendo o primeiro a sair do hospital. No dia 5 de Dezembro, Bob, depois de muitos alertas, resolveu subir ao palco do festival mesmo baleado. Ainda com os curativos, Marley se apresentou no concerto “Smile Jamaica”, pela paz, e depois mostrou os seus ferimentos ao público. Nesta ocasião, ao ser questionado sobre o fato de comparecer ao show mesmo baleado, o músico disse uma de suas mais conhecidas frases: “As pessoas que estão a tentar destruir o mundonão tiram um dia de folga. Como posso eu tirar, se estou a fazer o bem?”

A continuação da jornada musical
Logo após o concerto “Smile Jamaica”, o cantor mudou-se para Londres, temendo que fosse vítima de outro atentado político, devido aos temas e críticas políticas e sociais de suas músicas. Em Londres, gravou seu disco “Exodus”. A partir de então, o sucesso dos Wailers só aumentou e cada disco lançado destacava-se nas primeiras posições inglesas e americanas.
Bob Marley voltou a morar na Jamaica em 1978. O músico resolveu conceder um concerto gratuito em Kingston para comemorar o seu retorno. No dia 22 de abril de 1978, Bob Marley & The Wailers apresentaram-se no Estádio Nacional de Kingston, no famoso “One Love Peace Concert”. Neste show, Marley chamou ao palco o então primeiro-ministro jamaicano, Michael Manley, líder do partido PNP, e Edward Seaga, líder do partido da oposição, para que dessem as mãos e fizessem um juramento de paz. A multidão que assistia ao concerto foi à loucura.

Ainda em 1978, Bob foi pela primeira vez a África, onde visitou o Quénia e a Etiópia, país sagrado reverenciado pelo movimento rastafari. Depois de uma nova tournée pela Europa e EUA, o grupo lançou o disco ao vivo “Babylon By Bus”, e tocou na Austrália, Japão e Nova Zelândia. Em 1979, Bob Marley & The Wailers lançaram seu álbum mais politizaodo de todos. “Survival” tinha como tema nas suas músicas os problemas sociais e políticos pelos quais o continente africano passava, como guerras, fome e o domínio branco. Neste álbum, foi lançada a música “Zimbabwe”: uma música de apoio aos rebeldes negros da Rodésia, que estavam prestes a conquistarem sua independência do domínio branco, criando o estado do Zimbabwe. “Africa Unite” também é uma música clássica deste álbum, que mistura assuntos da fé rastafari com a situação social dos africanos. “Survival” chegou a ser censurado pelo regime do Apartheid na África do Sul. Mas, por sua vez, África era o único continente em que o grupo ainda não se havia apresentado. Porém, em 1980, após terem se apresentado no início do ano no Gabão, Bob Marley e sua banda foram convidados a se apresentarem na cerimonia de independência do Zimbabwe. Bob Marley & The Wailers apresentaram-se em 18 e 19 de abril na festa de independência, em Harare, no Zimbabwe.
Em maio de 1980, foi lançado “Uprising”, sucesso instantâneo no mundo inteiro com hits como “Could You Be Loved” e a comovente faixa de encerramento “Redemption Song”. Os Wailers embarcaram na sua maior tournée europeia, arrasando quarteirões em todos os lugares em que passaram, incluindo o legendário show em Milão, Itália, com público estimado em 100.000 pessoas, recorde absoluto até então para qualquer banda do mundo. Bob Marley & the Wailers eram simplesmente a banda em tournée mais importante daquele ano e o álbum “Uprising” bateu todas as paradas de sucesso no continente europeu. Foi um período de máximo otimismo na carreira de Bob Marley.

A descoberta do câncer e a batalha contra a doença
Após a tournée europeia, com uma vasta agenda marcada, Bob Marley e a banda partiram para os Estados Unidos, quando fizeram dois shows no Madison Square Garden. Durante a segunda apresentação, Bob passou mal no palco e começou a ser averiguado o que se passava com o ídolo do reggae. Bob, embora com problemas de saúde, chegou a fazer ainda mais um show em Pittsburgh, no dia 23 de setembro de 1980 (último show de Bob Marley), mas logo o mundo recebeu a triste notícia de que o astro do Reggae tinha cancro. A doença teria sido decorrente de um ferimento infeccionado no dedão do pé, que ele teria sofrido em 1977, durante uma partida de futebol em Londres. A ferida, quando feita, não havia cicatrizado, e sua unha posteriormente havia caído; foi então que o diagnóstico correto foi feito. Marley na verdade sofria de uma espécie de câncro de pele, chamado melanoma maligno, que se desenvolveu sob sua unha. Os médicos aconselharam-no a amputar o dedo, porém Marley recusou-se a fazê-lo devido à sua filosofia rastafari, de que o corpo é um templo que ninguém pode modificar (motivo pelos quais os rastas deixam crescer a barba e os dreadlocks). Ele também estava preocupado com o impacto da operação em sua dança; a amputação afetaria profundamente sua carreira no momento em que se encontrava no auge.

Colapso e tratamento
O cancro espalhou-se para o cérebro, o pulmão e o estômago. Ele lutou contra a doença durante oito meses buscando tratamento na clínica do Dr. Joseph Issels na Alemanha, no final de 1980 e início de 1981. Durante algum tempo, o estado de Marley parecia ter se estabilizado com o tratamento naturalista do doutor alemão.

Morte
Em maio de 1981, quando o Dr. Joseph Issels anuncia que nada mais poderia ser feito, Bob Marley já abatido pela doença, resolveu retornar para sua casa na Jamaica para passar seus últimos dias junto à família e amigos. Ele não conseguiu completar a viagem, tendo que ser internado em um hospital de Miami. A sua mãe segurava a sua mão aos prantos enquanto Bob a consolava pedindo que secasse as lágrimas dizendo: “Mãezinha não chores. Vou à frente para preparar um lugar.” Faleceu pouco antes do meio-dia de 11 de maio de 1981. Menos de 40 horas depois de deixar a Alemanha.

Reputação póstuma
A música, a mensagem e a lenda de Bob Marley ganharam mais e mais força desde a sua morte. Também lhe deu um status mítico, similar ao de Elvis Presley e John Lennon. Marley é enormemente popular e bastante conhecido ao redor do mundo inteiro. É considerado o rei do Reggae e é visto como uma das maiores vozes do povo pobre e oprimido, e um dos maiores defensores da paz, da liberdade e da igualdade social e de direitos. Após a sua morte, a data do seu aniversário, o dia 6 de fevereiro, foi decretado feriado nacional na Jamaica.

Convicções políticas e religiosas
Bob Marley era adepto do movimento político-religioso rastafari, que proclama Haile Selassie (imperador da Etiópia falecido em 1975) como a representação divina na Terra e que defende o retorno do homem negro pelo mundo para a África. Bob Marley, altamente influenciado pela filosofia rastafari, expressava espiritualidade e defendia a liberdade, paz, igualdade social e de direitos, o amor universal e a irmandade para toda humanidade nas suas músicas, fazendo com que o movimento rastafari fosse conhecido pelo mundo inteiro. Mortimer Planno foi um ancião rasta que deu-lhe ensinamentos sobre o movimento.
Se todos nos unirmos e dermos as mãos, quem sacará as armas? – Eu só tenho uma ambição: que a humanidade viva unida. Negros, brancos, orientais, todos juntos. – Eu não estou do lado dos negros nem dos brancos. Eu estou do lado de Deus, quem me fez vir do homem branco e do negro.
— Bob Marley
Marley era um grande defensor da planta Cannabis, usada por ele no sentido da comunhão. Na capa de Catch a Fire, inclusive, ele é visto a fumar uma “ganza”, e o uso espiritual de cannabis, característico do movimento rastafari, é mencionado em muitas das suas músicas. No movimento rasta, os dreadlocks representam a força espiritual, as raízes (assemelham-se, literalmente, a raízes) que une o homem à Mãe África.

Controvérsia sobre o local do túmulo
Em janeiro de 2005 foi divulgado que Rita Marley estava a planear exumar os restos de Bob Marley e enterrá-los em Shashamane, Etiópia. Ao anunciar sua decisão, Rita afirmou que “toda a vida do Bob foi centrada em África, não na Jamaica”. Os jamaicanos foram amplamente contra a proposta, e a comemoração do aniversário de Bob em 6 de fevereiro de 2005 foi celebrada em Shashamane pela primeira vez, pois, antes todas as outras haviam sido realizadas na Jamaica.

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